sexta-feira, 2 de janeiro de 2015

Lembro-me de ser criança

A lembrança mais antiga que tenho de mim é a de ter 3 anos. Foi há 40 anos. Estava doente, naquela altura tinha-se sarampo e a cor vermelha ajudava à recuperação...
Nesta mesma idade perdi o meu avô paterno, e sim, também me recordo disso. Recordo a dor, a tristeza, na memória tenho o momento como uma escuridão enorme.

Lembro-me da menina que era, alegre e inocente. Lembro-me da primária, da professora e dos colegas. Lembro-me da minha lancheira, das aulas de ginástica e do maion verde!
Lembro-me da 1.º vez que fui ao circo e da tempestade que estava nesse dia. Lembro-me das galochas laranja que usava com meias até ao joelho.

Lembro-me do 25 de abril de 1974, das tropas e dos cravos. Antes disso lembro-me da opressão, sim lembro-me disso.

Lembro-me de enfiar na boca uma caixa inteira de chicletes, fazer um balão gigantesco e perguntar onde foi ele rebentar. Nesse mesmo dia, à noite, lembro-me de estar sentada numa cadeira à minha medida com o cabelo cortado à maria-rapaz, a única forma de tirar a pastilha elástica do cabelo. Devia ter uns 7 anos. Lembro-me das lágrimas. 

Lembro-me das noites em que me ensinaram a falar com Deus.

Lembro-me de cuidar das minhas primas mais novas e por isso gostar tanto do livro Anita Mamã!
Lembro-me de saltar à corda, ao elástico, à macaca e desejar muito a bota botilde!!!

Lembro-me onde aprendi a andar de bicicleta, onde aprendi a nadar…lembro-me das férias de verão e de tudo parecer tão longe…lembro-me de dar muito valor ao pouco.

Lembro-me de quando comecei a sentir-me crescida e ainda nada sabia da vida.
Lembro-me das cabeçadas que dei e o que aprendi com elas. Lembro-me das lágrimas.

Lembro-me do 1.º dia de faculdade e do medo que senti no futuro. Da 1.ª vez que vi o mais que tudo, do dia que soube que estava grávida e depois do dia em que fui mãe, este sim, o dia mais importante de toda uma vida!

Lembro-me da 1.ª vez que andei de avião e do dia em que deixei o meu país. Lembro-me do dia do regresso e o que dói a saudade.

Lembro-me das amigas que tive e que foram embora, das que chegaram e que não quiseram ficar, ou talvez eu não as quisesse comigo. 
Lembro-me de querer voltar atrás tantas e tantas vezes, desejar muito do que não valia a pena. Querer retroceder sem saber qual o caminho certo.

Lembro-me de remar contra as marés, perder muito, mas ganhar muito mais. Lembro-me da coragem que tive e que agora não tenho.

Olho a vida que já passou e sei que estou onde sou feliz, mesmo que outrora os meus sonhos fossem maiores.

Lembro-me de como é bom ser criança e feliz, sem se saber que se é realmente.



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