sexta-feira, 26 de janeiro de 2018

Fui à faca!

Faz hoje precisamente 7 dias que fui à faca.

Tudo começou com o diagnóstico de uma hérnia discal lombar, agravou-se e a perna esquerda começou a ser castigada, não podia fugir mais disto, respirei fundo e lá fui.

Mas a espera, de mais ou menos uma semana, nunca é rápida nestas circunstâncias, pois não?
Escusado será dizer que os macaquinhos do sótão reuniram-se todos e fizeram a sua rave!  

Claro que aqui a je tinha que sair da consulta e, todos os dias, visitar o Dr. Google! E ele, se pode ser nosso amigo, também consegue ser um pessimista do pior! 

Li muito, pesquisei e até aprendi alguma coisita.
Entretanto o meu papão não era tanto a cirurgia, mas sim a anestesia. Em 46 anos nunca me adormeceram à força, além de que o meu sono é, por norma, muito leve.

Na consulta com o anestesista, pensava que só o marido me acompanhava...mas para ajudar à festa, os macaquinhos pessimistas também apareceram, Um batalhão deles e os otimistas estavam em desvantagem! Fraquinhos, não aguentam nada, a culpa foi da rave!

As minhas perguntas eram algo disparatadas, o médico ria-se e foi dizendo que se calhar até acordava a meio da operação...eu ri-me, mas um dos macacos segredou-me que o melhor era preparar-me, afinal o meu sono é leve que nem uma pena. Bolas, os outros continuavam ferrados e nem um dos macacos mais otimista parecia querer despertar. O médico ainda acrescentou que iria ADORAR a anestesia...pois, isso é porque não era ele...houve um macaco que bateu palminhas!

E se, para além de acordar a meio, não acordasse de todo? E se algo de errado acontecesse e não conseguisse mexer-me??? E voltaria para a minha casinha? Afinal, azares acontecem, certo? Raio dos macacos!

Fui preparando o que podia e organizando as coisas em casa, pois durante algum tempo a mobilidade seria reduzida.

Entretanto começou uma guerra de estados entre os macaquinhos, vieram também os carpideiros para se juntarem aos pessimistas e aos otimistas, estes continuavam zen, devem ter fumado uma cena qualquer na tal rave. Sinceramente fiquei desiludida com o seu trabalho!

Pois então, o dia chegou, chorei quando saí de casa, chorei quando a minha filha seguiu para a escola, chorei no quarto enquanto aguardava...os carpideiros macacos vieram cheios da gana e estavam a curtir do filme que realizavam, os produtores eram eles também, tudo na mão deles! Que gestão tão errada!

Entretanto, ofereceram-me dois comprimidos. Depois de perguntar, a enfermeira disse-me que serviam para eu relaxar...relaxar? Eu queria era ficar bem desperta a tudo o que faziam comigo.

Os macaquinhos queridos, os verdadeiramente meus amigos e que entendiam o meu momento, tinham voltado, os carpideiros e todo o grupo que participara na rave dos dias anteriores, estavam lá, mas numa de - deixem-nos dormir - baixaram guarda e acenavam a bandeira branca, se bem que ainda um resistia, aos saltinhos, mas a perder a força nas molas.

Deram-me uma bata, com lacinhos atrás, uma meias de liga brancas (prevenção de trombose) e umas cuequinhas de renda (daquelas descartáveis que nos dão na maternidade, quando somos mães). Ali fiquei à espera...não me perguntem o que conversamos, eu, o marido, a filha e os pais que entretanto tinham chegado. Não me lembro...os comprimidos apagaram alguns dos macacos mais resistentes.

E ainda que a cirurgia estivesse atrasada, de repente eu estava bem, lembro-me disso, mas de mais nada até ao bloco.
Vieram buscar-me perto das 15 horas...recebi os beijinhos da família e lá fui...

O frio...muito, muito. Tanto que abri a boca e queixei-me, seria o início de um rol de perguntas parvas.
Lençol quentinho em cima, um tubo com ar quente por baixo e pensei que, afinal até estava agradavelmente confortável e que uma soneca viria mesmo a calhar.
Tinha tudo controlado e se pensavam que me punham a dormir sem eu dar luta, estavam muito enganados (ou eu estava), eu resistiria.

Este estado só durou segundos. Os macaquinhos assistiam, uns choravam, outros batiam palmas e, agarrados a uma bebida qualquer (desconfio de álcool etílico), deliravam, o filme iria começar!
E eu, ali tão quentinha, tinha muita gente de volta de mim, tudo muito ocupado. Tiraram-me a bata e ligaram-me a umas cenas que apitavam...puxavam-me as pernas, levantavam-me os braços...lembro-me de pensar - felizmente que tratei de mim - depilação exemplar, até os pés pareciam pés de bebé! Meias de liga, cuequinhas de renda e nada mais, sexy, portanto.

Perguntei pelo médico, já iria descer.
Primeiro o cateter enfiado na veia da mão - é a anestesia, perguntei? Ainda não, é soro para não sei o quê.

Senti picadas, quase queimação no pulso - é a anestesia? Não, é para testarmos possíveis alergias (atenção que não estou bem ciente das respostas, apenas do não).
Electrodos na testa, e lembro-me de pensar que estaria dias com bolas tatuadas na testa!

Depois, ofereceram-me uma máscara, disseram que era o oxigênio e mandaram-me respirar fundo. Pensei, devem achar que me dão a volta assim, vou contar as vezes que respirar fundo e perguntar se é a .... ferrei! E realmente é verdade, o melhor de tudo é a anestesia. Não sei se quem a inventou levou algum prémio, mas se não, devia!

Depois, depois veio a parte cómica, assistida pela família. Saí do recobro e a filha ria-se, o meu estado era de alguém completamente grogue. 
Hoje, tenho a certeza que os macaquinhos carpideiros e os otimistas cederam à pressão dos outros que já se estavam a lixar para más notícias, só queriam era curtir a rave, que entretanto se estava a repetir. São todos uns agarradinhos!

No quarto, tornei-me a mulher dos comandos!
Comando para subir e descer a cama. Comando da TV. Comando para chamar a enfermeira e ainda o telemóvel. Segundo consta, eu pegava em todos, balançava-os e voltava a repetir...de boca aberta, olhos nem abertos nem fechados...era este o meu estado. Lembro-me do cansaço extremo, mas não sabia que tinha dado um espetáculo tão bom. Ainda bem que fiz rir.

Hoje estou em recuperação, muito lenta, mas sempre a melhorar. Os macaquinhos estão cá, há dias bons e outros menos bons. A recuperação é uma seca, mas tenho muita sorte, porque tenho muita ajuda e não estou sozinha. Mas sobre isso falarei outro dia.

Quando o enfermeiro vem mudar-me o penso, os macaquinhos estão sempre sentadinhos, uns de mãos juntinhas a rezar ao santo deles, outros a esfregar as mãozinhas na esperança de ouvirem alguma coisas desagradável sobre os agrafos agarrados a mim e que os leve a outra rave. Não vão conseguir!

(Podem rir à vontade, não me ofendo, afinal ADOREI a anestesia.)



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