quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

A solidão de um homem

Ontem, por razões que não interessam aqui, fiz uma visita às urgências do hospital.

Entre tantos rostos sofridos e corações apertados pela dor e incerteza sobre as razões porque estavam ali todas aquelas pessoas, destacou-se um rosto.

Andava por ali, misturava-se na multidão de uma sala de espera de um hospital.
Caminhava encolhido, não sei se pelo frio, se pelo peso da idade.

Ar simpático, educado, limpo, no seu canto, limitava-se a observar.

Nos olhos dele consegui ler que fora uma pessoa feliz, outrora.
Que aceitava a condição dele.
Que talvez até tivesse família, mas naquele momento estava sozinho.
Naquele e em todos os momentos, julgo.

Em certa altura levantou-se da cadeira que me pareceu ser bem conhecida dele...levou a mão ao bolso, restavam-lhe poucas moedas, espalhadas numa mão envelhecida...

Da máquina de café, tirou uma bebida quente. Tenho a certeza que não chegou para lhe aquecer a alma.

Voltou à cadeira, ao seu canto e olhei melhor, ao lado dele, mas escondido para não incomodar ninguém, como pessoa educada que me pareceu ser, estava um saco, lá dentro os poucos tesouros de uma vida e um cobertor. Eu sei que lhe pertencia o pouco daquilo.

Levantei os olhos para olhar melhor esta pessoa, cujos olhos sorriam, educada, sem que ninguém reparasse nela.
Ele percebeu que eu percebi o que ele ali fazia.

Numa noite muito fria.
Ali, ele encontrou o calor de gente que não conhecia e uma sala que o protegesse da noite de inverno, uma das muitas que têm ainda pela frente. 

As barbas grisalhas sei que não foi opção, foi necessidade perante as circunstâncias da sua vida.
Naquela noite ele escolheu estar ali, ao contrário de todos os outros que ali estavam, ele sentia-se feliz dentro da felicidade que é ter um canto quente e alguma companhia, mesmo que seja de desconhecidos.

Ele percebeu que eu percebi o que ele fazia ali.
Fiquei em silêncio e ele também.



Sem comentários:

Enviar um comentário